quinta-feira, maio 26, 2011

CRIMINOSO É ESSE AUMENTO

Que os verdadeiros criminosos assumam o seu lugar

Eu passei a minha vida inteira ouvindo a frase de Che Guevera que diz: “Se você é capaz de tremer de indignação cada vez que se faz uma injustiça no mundo, então somos companheiros”. Nesse tempo, acreditei piamente que eu era um daqueles. Estava enganado. Posso até ter me indignado, mas tremer de verdade só hoje descobri como é.

Logo cedo, pela manhã, abri minha caixa de e-mails e me deparei com uma mensagem em que vários movimentos e pessoas individualmente subscreviam uma petição de apoio a Enver José, militante do movimento estudantil de João Pessoa (PB) e um defensor incondicional das causas populares, entre as quais a luta por um transporte público de mais qualidade. Esse engajamento, segundo a petição, lhe rendeu um absurdo processo em que é acusado de tentativa de homicídio, com a mais absurda ainda justificativa de que ele teria atirado um objeto semelhante a uma granada em um ônibus durante as manifestações que decorreram do aumento abusivo no preço das passagens do transporte coletivo da cidade nas férias de 2010 para 2011.

Tremi e ainda tremo de indignação, e tenho dezenas de motivos para citar aqui. Antes de tudo, entretanto, preciso falar um pouco sobre quem é esse menino que injustamente está tendo de carregar nas costas toda a revolta de um setor empresarial assustado com a possibilidade de ser obrigado a prestar um serviço de qualidade aos cidadãos de João Pessoa.

Enver

Desde os meus 15 anos, até pouco tempo atrás, participei dos mais diversos espaços políticos que se pode imaginar. Lidei com militantes das mais diversas matizes, fosse como aliado ou como rival nas ideias. Nesse caminho, tanto ao meu lado quanto nos campos opostos, conheci gente de todo tipo, dos mais desprovidos de caráter aos mais honestos e sinceros sonhadores. Entre todos, pouquíssimos conseguiram levar à frente seus ideais de modo tão coerente quanto Enver. Consciente, fiel aos seus princípios e defensor das mobilizações pacíficas, sempre se colocou no lado mais fraco da corda, dando todas as suas forças – muitas vezes, sacrificando até sua própria vida pessoal – para ajudar a sustentar lutas legítimas das quais muita gente depende mas poucos têm a coragem de lutar. E justamente por isso ele está sofrendo esse ataque, por parte de um grupo que nunca foi nenhum exemplo de honestidade.

As empresas

Quando digo que tremi de indignação, não foi simplesmente por tudo que acabo de dizer sobre o militante. O que mais me perturba é saber que as acusações partem de um setor que não desfruta de nenhuma prerrogativa para acusar alguém. De um cartel que tem a cara dura de estampar na entrada dos seus veículos um “obrigado pela preferência”, quando todos sabemos que o monopólio, dominado praticamente por uma única família, é nossa única opção. Uma facção que avilta cotidianamente até os direitos de consumidor mais básicos dos quais deveríamos gozar: um serviço de qualidade e um preço justo. De senhores que não se incomodam de dar nomes santos a suas empresas e estampar imagens religiosas nos seus veículos ao mesmo tempo em que impõem aos seus funcionários péssimas condições de trabalho, sob um regime de assédio moral constante, obrigando-os muitas vezes, inclusive, a arcar com prejuízos decorrentes de assaltos e acidentes, mesmo que causados por falhas mecânicas (por mais que as propagandas falem de uma frota renovada, vários veículos velhos continuam na frota, principalmente nas linhas que cobrem bairros mais pobres). 

A nossa parte

Enquanto cidadãos, não podemos mais nos calar, como nas viagens de volta para casa após o trabalho, em ônibus lotados (todo trabalhador pessoense que anda de ônibus está aí para provar o que digo). Como nas horas que passamos esperando um ônibus que, oficialmente, deveria passar a cada 15 ou 20 minutos (quem trabalha na região coberta pelas linhas Mangabeira-Shopping entende o que falo). Como nas mudanças de rota sem aviso prévio à população, que, em muitos casos, precisa recorrer à adivinhação para saber onde tomar sua condução (isso, os moradores do José Américo pode explicar muito bem). Enfim, sempre que somos vítimas de uma manobra das empresas de ônibus que se pautam sempre, e exclusivamente, pela maximização dos seus lucros, evidentemente, às custas do povo.

Tática de máfia

O que estão fazendo com Enver é intimidação, para que sirva de exemplo a todos os outros cidadãos de bem que, por não suportarem mais os abusos cotidianos dos maus serviços de ônibus, já estejam pensando em organizar ou se engajar em algum protesto. É assim, com táticas de máfia, que eles agem para preservar os seus interesses. 

Não esqueçamos que criminalizar seus desafetos ou concorrente já é um velho expediente do cartel dos ônibus de João Pessoa, que há anos trabalha para relegar à condição de ilegal e criminosa a atividade de transporte alternativo, que, na verdade, se fosse regulamentada (com regras que, evidentemente, coibissem as más práticas existentes atualmente, decorrentes, em grande parte, da desregulamentação) permitiria que desfrutássemos do mais básico princípio do capitalismo, nesse sistema feudal de concessões hereditárias: a livre concorrência, fator que, bem ou mal, obrigaria as empresas a oferecerem um melhor serviço, sob o risco de perderem clientela.

É por temerem ser obrigados a prestar um bom serviço, inclusive, que os empresários estão tentando impor o medo a toda a população de João Pessoa. Mas absurdo mesmo seria eles conseguirem. 

Não esqueçam que a luta de Enver tem sido por cada um de nós, tanto os que foram lá lutar ao lado dele, quanto os que ficamos em casa vendo a vida passar.

Convocação

Faço aqui, mais urgentemente, uma convocação a todos que, de alguma maneira, sentem-se agredidos por esse ataque ilegítimo a um aliado do povo. 

Leiam e subscrevam a manifestação de apoio a Enver. Ela será muito importante na luta contra a injustiça que está sendo cometida: http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2011N10337

Além disso, quero convocá-los também a intensificar o debate sobre a qualidade dos transportes que nos são oferecidos (você que desfruta da frota renovada, lembre de quem mora no Colinas do Sul) e os abusivos aumentos que somos obrigados a engolir todos os anos, a despeito do visível aumento nas receitas das empresas através de, entre outras coisas, as publicidades internas que pagamos para assistir e virar estatística de público nos media kits apresentados pelo marketing das companhias aos seus anunciantes.

Políticos

À Câmara de Vereadores e à Assembleia dos Deputados, convoco-os, nobres representantes, a cumprir com seu papel de aliados da sociedade, sem medo de verem o financiamento de suas campanhas comprometido pela fuga dos “apoios” dos empresários do setor de transporte público que, ventila-se por aí, são bem generosos.

Imprensa

Aos meus colegas jornalistas, convido-os a dar uma revisada no nosso surrado código de ética, que não nos permite nunca esquecer que nosso trabalho deve ser pautado pelo interesse público. Interesse que não pode ser subjugado nem mesmo pelo afago concedido em forma de prêmio a alguns da categoria no final do ano pelas empresas de ônibus.

É muito perigoso aceitar inversões de valores como a que ocorre nesse caso. Não podemos permitir que uma vítima assuma o papel de criminoso que, definitivamente, não lhe cabe. 

Que os verdadeiros criminosos assumam o seu lugar.

Simão Mairins
jornalista

Nenhum comentário :

Postar um comentário

quinta-feira, maio 26, 2011

CRIMINOSO É ESSE AUMENTO

Que os verdadeiros criminosos assumam o seu lugar

Eu passei a minha vida inteira ouvindo a frase de Che Guevera que diz: “Se você é capaz de tremer de indignação cada vez que se faz uma injustiça no mundo, então somos companheiros”. Nesse tempo, acreditei piamente que eu era um daqueles. Estava enganado. Posso até ter me indignado, mas tremer de verdade só hoje descobri como é.

Logo cedo, pela manhã, abri minha caixa de e-mails e me deparei com uma mensagem em que vários movimentos e pessoas individualmente subscreviam uma petição de apoio a Enver José, militante do movimento estudantil de João Pessoa (PB) e um defensor incondicional das causas populares, entre as quais a luta por um transporte público de mais qualidade. Esse engajamento, segundo a petição, lhe rendeu um absurdo processo em que é acusado de tentativa de homicídio, com a mais absurda ainda justificativa de que ele teria atirado um objeto semelhante a uma granada em um ônibus durante as manifestações que decorreram do aumento abusivo no preço das passagens do transporte coletivo da cidade nas férias de 2010 para 2011.

Tremi e ainda tremo de indignação, e tenho dezenas de motivos para citar aqui. Antes de tudo, entretanto, preciso falar um pouco sobre quem é esse menino que injustamente está tendo de carregar nas costas toda a revolta de um setor empresarial assustado com a possibilidade de ser obrigado a prestar um serviço de qualidade aos cidadãos de João Pessoa.

Enver

Desde os meus 15 anos, até pouco tempo atrás, participei dos mais diversos espaços políticos que se pode imaginar. Lidei com militantes das mais diversas matizes, fosse como aliado ou como rival nas ideias. Nesse caminho, tanto ao meu lado quanto nos campos opostos, conheci gente de todo tipo, dos mais desprovidos de caráter aos mais honestos e sinceros sonhadores. Entre todos, pouquíssimos conseguiram levar à frente seus ideais de modo tão coerente quanto Enver. Consciente, fiel aos seus princípios e defensor das mobilizações pacíficas, sempre se colocou no lado mais fraco da corda, dando todas as suas forças – muitas vezes, sacrificando até sua própria vida pessoal – para ajudar a sustentar lutas legítimas das quais muita gente depende mas poucos têm a coragem de lutar. E justamente por isso ele está sofrendo esse ataque, por parte de um grupo que nunca foi nenhum exemplo de honestidade.

As empresas

Quando digo que tremi de indignação, não foi simplesmente por tudo que acabo de dizer sobre o militante. O que mais me perturba é saber que as acusações partem de um setor que não desfruta de nenhuma prerrogativa para acusar alguém. De um cartel que tem a cara dura de estampar na entrada dos seus veículos um “obrigado pela preferência”, quando todos sabemos que o monopólio, dominado praticamente por uma única família, é nossa única opção. Uma facção que avilta cotidianamente até os direitos de consumidor mais básicos dos quais deveríamos gozar: um serviço de qualidade e um preço justo. De senhores que não se incomodam de dar nomes santos a suas empresas e estampar imagens religiosas nos seus veículos ao mesmo tempo em que impõem aos seus funcionários péssimas condições de trabalho, sob um regime de assédio moral constante, obrigando-os muitas vezes, inclusive, a arcar com prejuízos decorrentes de assaltos e acidentes, mesmo que causados por falhas mecânicas (por mais que as propagandas falem de uma frota renovada, vários veículos velhos continuam na frota, principalmente nas linhas que cobrem bairros mais pobres). 

A nossa parte

Enquanto cidadãos, não podemos mais nos calar, como nas viagens de volta para casa após o trabalho, em ônibus lotados (todo trabalhador pessoense que anda de ônibus está aí para provar o que digo). Como nas horas que passamos esperando um ônibus que, oficialmente, deveria passar a cada 15 ou 20 minutos (quem trabalha na região coberta pelas linhas Mangabeira-Shopping entende o que falo). Como nas mudanças de rota sem aviso prévio à população, que, em muitos casos, precisa recorrer à adivinhação para saber onde tomar sua condução (isso, os moradores do José Américo pode explicar muito bem). Enfim, sempre que somos vítimas de uma manobra das empresas de ônibus que se pautam sempre, e exclusivamente, pela maximização dos seus lucros, evidentemente, às custas do povo.

Tática de máfia

O que estão fazendo com Enver é intimidação, para que sirva de exemplo a todos os outros cidadãos de bem que, por não suportarem mais os abusos cotidianos dos maus serviços de ônibus, já estejam pensando em organizar ou se engajar em algum protesto. É assim, com táticas de máfia, que eles agem para preservar os seus interesses. 

Não esqueçamos que criminalizar seus desafetos ou concorrente já é um velho expediente do cartel dos ônibus de João Pessoa, que há anos trabalha para relegar à condição de ilegal e criminosa a atividade de transporte alternativo, que, na verdade, se fosse regulamentada (com regras que, evidentemente, coibissem as más práticas existentes atualmente, decorrentes, em grande parte, da desregulamentação) permitiria que desfrutássemos do mais básico princípio do capitalismo, nesse sistema feudal de concessões hereditárias: a livre concorrência, fator que, bem ou mal, obrigaria as empresas a oferecerem um melhor serviço, sob o risco de perderem clientela.

É por temerem ser obrigados a prestar um bom serviço, inclusive, que os empresários estão tentando impor o medo a toda a população de João Pessoa. Mas absurdo mesmo seria eles conseguirem. 

Não esqueçam que a luta de Enver tem sido por cada um de nós, tanto os que foram lá lutar ao lado dele, quanto os que ficamos em casa vendo a vida passar.

Convocação

Faço aqui, mais urgentemente, uma convocação a todos que, de alguma maneira, sentem-se agredidos por esse ataque ilegítimo a um aliado do povo. 

Leiam e subscrevam a manifestação de apoio a Enver. Ela será muito importante na luta contra a injustiça que está sendo cometida: http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2011N10337

Além disso, quero convocá-los também a intensificar o debate sobre a qualidade dos transportes que nos são oferecidos (você que desfruta da frota renovada, lembre de quem mora no Colinas do Sul) e os abusivos aumentos que somos obrigados a engolir todos os anos, a despeito do visível aumento nas receitas das empresas através de, entre outras coisas, as publicidades internas que pagamos para assistir e virar estatística de público nos media kits apresentados pelo marketing das companhias aos seus anunciantes.

Políticos

À Câmara de Vereadores e à Assembleia dos Deputados, convoco-os, nobres representantes, a cumprir com seu papel de aliados da sociedade, sem medo de verem o financiamento de suas campanhas comprometido pela fuga dos “apoios” dos empresários do setor de transporte público que, ventila-se por aí, são bem generosos.

Imprensa

Aos meus colegas jornalistas, convido-os a dar uma revisada no nosso surrado código de ética, que não nos permite nunca esquecer que nosso trabalho deve ser pautado pelo interesse público. Interesse que não pode ser subjugado nem mesmo pelo afago concedido em forma de prêmio a alguns da categoria no final do ano pelas empresas de ônibus.

É muito perigoso aceitar inversões de valores como a que ocorre nesse caso. Não podemos permitir que uma vítima assuma o papel de criminoso que, definitivamente, não lhe cabe. 

Que os verdadeiros criminosos assumam o seu lugar.

Simão Mairins
jornalista

Nenhum comentário :

Postar um comentário